Brecha no mercado imobiliário pode atrair crime organizado

02 de DEZEMBRO de 2025 • Por:

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Enquanto país se movimenta para apertar o cerco à lavagem de dinheiro, decisão do CNJ abre espaço para operações fraudulentas com imóveis

Em tempos de revelações bombásticas sobre os sofisticados métodos do crime organizado para lavar bilhões de reais, uma contradição ronda as iniciativas dos Três Poderes para incrementar o combate às fraudes. Uma nova trilha para a lavagem de recursos ilícitos foi aberta com uma decisão liminar do corregedor Nacional de Justiça, o ministro Mauro Campbell Marques, em novembro de 2024, ao definir que basta um instrumento particular, sem registro público, para validar formalmente uma operação de compra e venda de imóveis com alienação fiduciária em garantia.

A liminar suspendeu os efeitos dos Provimentos nº 172 e 175 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o que passou a permitir que todos os contratos de compra e venda de imóveis baseados em garantia por alienação fiduciária, mesmo os realizados fora do Sistema de Financiamento Imobiliário (SFI) e ao Sistema Financeiro de Habitação (SFH), dispensem a necessidade da escritura pública.

Na decisão, o corregedor acolheu o argumento do Ministério da Fazenda, apresentado pela Advocacia Geral da União (AGU), de que isso traria mais agilidade e menos custos, baseado em um estudo de impacto econômico elaborado pelo mercado imobiliário. Mas a medida tem efeitos colaterais no controle e na prevenção de operações fraudulentas.

“A escritura pública representa importante mecanismo de controle, segurança e rastreabilidade das operações de grande valor, que serve para dificultar a ação da criminalidade interessada em ocultar ativos”, avalia o professor Leandro Sarcedo, da Faculdade de Direito da USP. O advogado criminalista destaca a criatividade e o oportunismo do crime organizado revelados pelas recentes investigações da Operação Carbono Oculto, que desarticulou esquema no setor de combustíveis, responsável pela movimentação de mais de uma centena de bilhões de reais. “Essa operação colocou o Ministério Público do Estado de São Paulo, a Polícia Federal e a Receita na Avenida Faria Lima, símbolo de poder econômico e sofisticação de São Paulo e do Brasil, e devia servir de exemplo do tamanho do problema que estamos enfrentando em relação à infiltração do crime organizado nas instituições sociais e mesmo do Estado”, alerta Sarcedo.

Desde fevereiro de 2020, os cartórios são obrigados a comunicar o COAF a respeito de transações de compra e venda de imóveis, procurações, dívidas e registros de empresas que gerem suspeitas. Porém, com a dispensa da escritura pública em algumas operações, os tabeliães têm menos possibilidades de produção de COS (Comunicação de Operação Suspeita) ao COAF e de DOI (Declaração sobre Operações Imobiliárias) à Receita Federal. Essa fragilização de defesas institucionais no mercado imobiliário chega justamente em um momento de crescente preocupação com crimes econômicos, como o caso do Banco Master, talvez o mais ruidoso da história do sistema bancário brasileiro.

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