TRF-3 valida envio de dados do Coaf à polícia sem aval da Justiça e reacende debate sobre sigilo bancário

22 de AGOSTO de 2025 • Por:

Uma decisão recente do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3) reacendeu o debate sobre os limites legais da atuação do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) em investigações criminais. Por unanimidade, o colegiado rejeitou um pedido de habeas corpus que buscava anular provas obtidas por meio de relatórios de inteligência financeira (RIFs) enviados diretamente pelo Coaf à Polícia Federal e ao Ministério Público Federal (MPF), sem autorização judicial prévia.

O caso concreto envolvia investigações sobre possíveis irregularidades na contratação de empresas pela prefeitura de Sorocaba (SP), para prestação de serviços nas áreas de transporte e saúde. Durante a apuração, a Polícia Federal solicitou ao Coaf o envio de dados financeiros dos investigados. A defesa alegava quebra indevida de sigilo, mas a tese não foi acolhida. O MPF, em parecer, afirmou que a prática está respaldada na Lei nº 9.613/1998, que trata da prevenção à lavagem de dinheiro.

Para os desembargadores, o envio dos relatórios não representou violação do sigilo bancário, já que se tratam de comunicações obrigatórias feitas por instituições financeiras e que não dependem, nesse contexto, de autorização judicial. A decisão do TRF-3 seguiu o entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no Recurso Extraordinário 1.055.941, que deu origem ao Tema 990 da repercussão geral.

STF e o precedente de 2019

O Supremo fixou, em 2019, que o compartilhamento de informações pelo Coaf com o Ministério Público e autoridades policiais é constitucional, desde que respeitados os limites legais. A decisão estabeleceu que os dados compartilhados se referem a um dever legal das instituições financeiras de informar operações suspeitas, e não a uma quebra de sigilo bancário.

Para o professor de Direito Penal da PUC-SP e criminalista Leonardo Massud, a decisão do TRF-3 enfraquece a proteção constitucional à privacidade. “Nossa Constituição protege o direito à privacidade, que engloba, entre outros, o sigilo bancário. Como todo direito, ele não é absoluto, mas só poderia ser mitigado com motivação e autorização judicial. A própria existência de órgãos que escrutinam essas operações sem causa de justificação prévia já é em si uma violação”, afirma o advogado.

Ele acrescenta que o Judiciário acabou cedendo em favor de supostos imperativos de segurança pública: “Dentro da perspectiva de que o Coaf e os chamados relatórios de inteligência financeira foram considerados constitucionais, ainda há uma divisão na doutrina e na jurisprudência a respeito da possibilidade ou não de requisição direta a esses órgãos por parte das autoridades públicas, como Polícias e Ministérios Públicos. Dizer que isso é possível, como fez recentemente o TRF-3, é, mais uma vez, tornar o texto constitucional decorativo.”

Segurança jurídica e investigações financeiras

A decisão do TRF-3, ao reforçar o precedente do Supremo, busca dar segurança jurídica às autoridades que atuam em investigações financeiras. Segundo o MPF, os RIFs são documentos administrativos e não se equiparam a extratos bancários. Eles são elaborados com base em comunicações obrigatórias de instituições financeiras, que alertam o Coaf sobre movimentações suspeitas.

A discussão deve continuar nos tribunais superiores, especialmente no Supremo Tribunal Federal, que terá a responsabilidade de definir de forma definitiva até onde vai a legitimidade do compartilhamento de dados pelo Coaf sem ordem judicial.

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